Foto da capa tirada por Andy Frank no Estádio José Martí, em Cuba |
O sétimo álbum de estúdio do a-ha está completando 20 anos. Lançado em abril de 2002, o Lifelines comemora duas décadas como um dos trabalhos de maior sucesso da banda na Europa. O disco alcançou o primeiro lugar das paradas na Alemanha e na Noruega, entrando também para o Top 10 em países como Áustria, Dinamarca, Grécia, Polônia e Suíça. Ainda na Alemanha, o álbum recebeu a certificação de disco de ouro por vender mais de 150 mil cópias.
Gravado entre junho de 2001 e janeiro de 2002, o Lifelines contou com apenas três singles: Forever Not Yours, o maior sucesso do disco, Did Anyone Approach You? e a própria faixa-título. Se a banda economizou no número de singles, o mesmo não aconteceu com o número de produtores. Ao todo, foram seis profissionais diferentes, de várias nacionalidades, para produzir as 15 faixas do álbum: os britânicos Ian Caple, Clive Langer e Alan Winstanley, os suecos Martin Landquist e Tore Johansson, e o americano Stephen Hague.
“Em Lifelines havia muitos produtores e eles acabaram participando de uma verdadeira guerra de trincheiras. Todos se tornaram paranóicos. Nós gravamos algumas canções três, quatro vezes e no fim ninguém sabia mais o que estava bom”, afirmou Paul no livro The Swing of Things.
Morten também se queixou da forma como o disco foi produzido. “No álbum há muitas canções que sofreram devido à forma como foram produzidas, o que é uma verdadeira vergonha. Lifelines era um forte candidato para ser um verdadeiro álbum clássico do a-ha, mas acabou se tornando um disco que tentou ir em várias direções e algumas canções simplesmente naufragaram”, disse o vocalista no mesmo livro.
Capa do single de Forever Not Yours, lançado em 2 de abril de 2002 |
Turn the Lights Down, a décima primeira faixa do álbum, foi uma das canções apontadas por Morten que terminou soando diferente após a produção. “Acabou como uma balada comum. Ela poderia ter sido matadora. Magne escreveu uma parte muito importante, mas no fim, a canção acabou se tornando algo que absolutamente não deveria ter se tornado. Na minha cabeça, a canção foi totalmente mal administrada e o Paul também achou isso, porém, eu não tive a habilidade e a paz de espírito necessárias para me sentar e mostrar ao Mags o que eu queria. É uma canção que poderia ter ido muito longe”, declarou Morten.
O mesmo aconteceu com Oranges on Appletrees. “Ela foi produzida toda errada. Deve ter sido produzida sob influência de cogumelos mágicos. Basicamente, é uma canção muito excitante... Meio boêmia, meio hippie”, afirmou o vocalista.
O Lifelines foi o último álbum do a-ha a ser lançado pela Warner Music. Na época, a relação da banda com a gravadora já não era das melhores. Em entrevistas, o grupo demonstrava claramente o seu descontentamento com o selo. “Eles só pensam em nomes completamente novos e esquecem que deve haver algumas pessoas por aí que já ouviram falar de nós. Afinal, estamos aqui há muito tempo”, disse Paul em maio de 2002 em entrevista ao jornal norueguês Dagbladet.
Àquela altura, o desgaste entre o a-ha e a Warner já era tão grande que havia um acordo incomum entre as duas partes: a banda entregava uma fita master finalizada, enquanto a gravadora se comprometia a não interferir na produção. O selo só entrava no processo quando a seleção final das músicas precisava ser feita.
Capa do single de Lifelines, lançado em 8 de julho de 2002 |
Para gravar o Lifelines, o a-ha precisou, além dos seis produtores, percorrer quatro países diferentes ao longo de sete meses. Isso porque a banda utilizou estúdios em Oslo, Londres, Estocolmo e Nova York. “É extremamente raro gravar um álbum desta forma”, declarou o produtor britânico Ian Caple, responsável por quatro faixas do disco. O trio, no entanto, raramente estava junto na maioria das gravações. Morten, por exemplo, gravou quase todos os vocais do álbum sem a presença de Paul e Mags.
“Morten e Magne começaram a trabalhar sem mim e foi difícil convencer o Morten a cantar as minhas canções. Eu tive que ser diplomático. Foi um álbum onde tudo foi bem difícil. Eu tive apenas duas semanas para escrever canções para ele e no fim tinha dez canções prontas e estava satisfeito com elas. Eu tinha certeza que eles gostariam delas, mas não gostaram. Algumas delas foram engavetadas, outras se tornaram canções da Savoy. Tem uma chamada The Breakers que é um clássico, mas ninguém gostou”, lamentou Paul.
As queixas do guitarrista tinham um fundo de verdade. Das 15 faixas do álbum, quatro foram fruto da parceria entre Morten e Mags, seja na composição ou nos arranjos. Algo inédito na história da banda. “Em Lifelines, eu tentei escrever canções com o estilo do Morten em mente. Há algumas canções nele que eu gosto mais do que outras”, afirmou Mags.
Apesar da colaboração entre os dois, Morten reconheceu que não foi um processo fácil. “Como resultado das batalhas anteriores com o Paul, Magne se tornou tão difícil de se negociar quanto ele. Magne foi muito longe por suas canções. O álbum se tornou seu projeto particular. Ele queria fazer tudo do seu jeito, sem dar a mínima para mim”, disse Morten.
Capa do single de Did Anyone Approach You?, lançado em 30 de setembro de 2002 |
E o tecladista realmente estava decidido a criar suas canções sem a interferência dos colegas. “Para mim, o Lifelines foi um álbum onde aprendi a não dar a mínima para os outros na banda e a trabalhar apenas com quem estava interessado com o meu material. Pode não ser a lição mais legal, mas é uma lição importante. O resultado final foi um álbum que soa desunido, pois realmente não estávamos unidos”, assumiu Mags.
Entre as músicas compostas por Paul que acabaram não agradando o restante do grupo, estavam There's a Reason for It, Afternoon High, A Little Bit e Less Than Pure. “Todas as canções que o Paul trouxe para as gravações tinham partes interessantes, mas no todo, pareciam incompletas. Elas não tinham refrões que as levassem a algum lugar, elas simplesmente não iam muito longe”, declarou Morten.
“E foi assim com quase todas elas, com exceção de Time & Again e Did Anyone Approach You?. Essas duas vão direto ao ponto e estão entre as melhores do álbum. O resto é pura perda de tempo. Eu não queria nem mesmo cantar elas. Eu não queria pois não quis ser envolvido em difíceis discussões sobre canções que já sabia que não deveriam estar no disco. Mas eu acabei cantando para mostrar que eu estava certo. Eu sei o que esperar do Paul e o que ele é capaz de fazer, mas é ele que tem que me entregar”, completou o vocalista.
No site oficial do a-ha, Mags chegou a declarar na época que o Lifelines era uma gravação ambiciosa. “Pessoalmente, sinto que escrevi minhas melhores músicas de todos os tempos”, disse o tecladista. O álbum, inclusive, foi um dos mais caros já produzidos pela banda.
A repercussão do disco na imprensa europeia foi muito positiva. O jornal norueguês Dagbladet publicou que o a-ha deu um grande passo na direção certa, enquanto o também norueguês Aftenposten disse que a banda fez um de seus melhores trabalhos. Já a rádio alemã SWR3 registrou que o Lifelines “é um álbum muito complexo e suntuoso”.
De fato, mesmo com tantas divergências durante o seu processo de criação, o Lifelines permanece, passados 20 anos desde o seu lançamento, um álbum relevante na discografia do a-ha. Produziu algumas das mais belas canções da carreira do grupo, como White Canvas, Time & Again, Dragonfly e a própria faixa-título. “Lifelines é o tipo de música que faz com que as pessoas nos reconheçam, quer sejam os caras do Coldplay ou outros artistas... Quem a ouvir já sabe que ainda somos bons no que fazemos”, resumiu Morten.